Leonardo José Diretor de Programas e Projetos
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Descentralizar a inovação: empreendedorismo como catalisador de políticas públicas

Artigo
5 agosto 2025
Descentralizar a inovação: empreendedorismo  como catalisador de políticas públicas

Nos últimos anos, testemunhamos um avanço importante no reconhecimento do empreendedorismo social como vetor legítimo de desenvolvimento e como uma dimensão possível das políticas públicas.

Por que falar em empreendedorismo social como política pública?

Historicamente, negócios de impacto social ocuparam dois espaços que não necessariamente revelam a realidade: ou estavam categorizados em um lugar de assistencialismo, dada à natureza e propósito, ou eram enquadrados sob a lógica tradicional do empreendedorismo de mercado, modelo muitas vezes incompatível com as vivências das periferias e favelas.

Aqui, estamos falando de outra lógica: negócios que geram renda e, ao mesmo tempo, respondem a desafios reais da coletividade e dos territórios. Eles são criados para resolver problemas urgentes, a partir das potências locais, com modelos sustentáveis e socialmente comprometidos.

Para o CIEDS, não basta enxergar o empreendedorismo como solução individual. É preciso estruturá-lo como uma resposta coletiva, ancorada em redes de apoio, políticas estruturantes e marcos legais que compreendam as particularidades dos territórios e da população empreendedora que neles vive.

Neste sentido, podemos hoje celebrar um novo cenário: surgem instrumentos legais e institucionais que reconhecem o empreendedorismo de impacto como política pública. É o caso da Lei nº 14.816/2024, que cria o Ministério do Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Embora ainda recente, sua criação representa uma oportunidade real de promoção e fortalecimento de empreendimentos com foco em impacto social e ambiental.

O que diferencia o empreendedorismo de impacto?

O empreendedorismo de impacto que praticamos e fortalecemos no CIEDS é aquele que, além de ser economicamente viável, é essencialmente voltado ao bem comum. São negócios com propósito, criados dentro das comunidades, que oferecem produtos ou serviços que geram soluções para problemas coletivos.

São empreendimentos que nascem de um desafio social, mas carregam em si novas lógicas de consumo, produção e valor, muitas vezes diferentes das exigidas pelo mercado tradicional. Justamente por isso, esses negócios exigem tempos de maturação distintos, apoio técnico, investimento público e um ecossistema que reconheça seu potencial transformador.

Apoiar o empreendedorismo é garantir escolha, e não impor um caminho

Falar em empreendedorismo como política pública é também falar sobre liberdade. Não se trata de impor o empreendedorismo como única saída diante da ausência de empregos formais. O que defendemos é que empreender seja uma escolha real, feita com dignidade, acesso a crédito, formação adequada, incentivo à sustentabilidade e inserção em redes de apoio.

Para quem está no território, o mais importante é ter autonomia para decidir: quero ser empreendedor ou quero buscar um trabalho com carteira assinada? A prosperidade está justamente nessa liberdade de escolha, e não em modelos únicos e inflexíveis.

PISTA: inovação social, tecnológica e ambiental a partir da favela

No CIEDS, transformamos esse entendimento em prática. Em 2024, lançamos o Parque de Inovação Social, Tecnológico e Ambiental – PISTA, o primeiro e único parque de inovação social do Brasil localizado dentro de uma favela: a Rocinha, no Rio de Janeiro.

A Rocinha é um território com intensa dinâmica comercial. Sua atividade econômica supera a de 90% das cidades brasileiras. O governo do estado do Rio de Janeiro, por meio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), deu um passo inédito ao destinar recursos públicos para fomentar o empreendedorismo, a inovação e o desenvolvimento local na comunidade.

O PISTA atua como um catalisador de tecnologias sociais, negócios de impacto e formação profissional em áreas emergentes, articulando uma rede de agentes públicos, privados, acadêmicos e comunitários, a chamada “quádrupla hélice”. Nesse modelo, os moradores não são apenas beneficiários, mas protagonistas da inovação.

Com isso, vemos surgir um ambiente muito mais fértil para negócios de impacto, com maior credibilidade junto ao setor privado e descentralização de recursos, que antes estavam restritos a centros acadêmicos e chegam agora às comunidades.

Resultados de impacto em 2024

Em 2024, o CIEDS teve resultados expressivos que comprovam o impacto da nossa atuação em empreendedorismo social:

640 empreendimentos fortalecidos, sendo 48% liderados por mulheres negras;

16,83% foi a média de crescimento de renda dos negócios apoiados;

R$ 559.700 investidos diretamente no fortalecimento de negócios periféricos, em ações que combinam formação, mentoria e acesso a oportunidades reais.

Caminhos possíveis e a construção de um futuro mais justo

É nesse contexto que o CIEDS atua, fortalecendo o empreendedorismo de impacto com programas como o Shell Iniciativa Jovem, iniciativa que há 16 anos conta com a execução do CIEDS para capacitar e empoderar jovens empreendedores no Brasil, preparando-os para criar e desenvolver negócios sustentáveis e socialmente relevantes.

Não temos todas as respostas, mas temos clareza sobre onde estão as perguntas certas e seguimos testando, investindo e construindo soluções com quem vive os desafios na prática.

É tempo de descentralizar a inovação e colocar a periferia no centro da política de desenvolvimento. E o empreendedorismo social é um dos caminhos mais promissores para isso.