A autoestima é uma das dimensões mais importantes do bem-estar psicológico e da boa saúde mental. Elisama Carneiro, de 54 anos, que o diga. Ela faz tratamento há mais de 15 anos no Instituto Municipal Nise da Silveira. De lá para cá, viu sua vida mudar: orgulha-se em dizer que olha para as pessoas “de igual para igual”.
Elisama passou a frequentar o Nise depois de sofrer traumas na família, além de um relacionamento abusivo. Sentiu-se culpada ao ver que as desavenças em casa estavam afetando seu filho, hoje com 32 anos e também paciente do instituto. “Todos me colocavam para baixo, daí acabei entrando em uma depressão profunda. Passei por momentos muito difíceis, mas pior ainda foi ver que meu filho estava sofrendo as consequências da confusão que era nossa vida”.
A depressão também foi um obstáculo na sua vida profissional. Sentia-se “invisível”, por conta da baixa autoestima. “Meu maior desejo era ter um trabalho de carteira assinada, mas, quando conseguia algo, era sempre um ‘bico’. Emprego parecia um sonho muito distante, porque eu me sentia inferior, achava que aquilo não era para mim. Tinha medo das pessoas e andava sempre olhando para o chão, então elas também não me olhavam de volta”.
Ao tornar-se paciente, Elisama passou a ter acesso não somente a medicações e sessões de psicoterapia, mas também a oficinas de teatro, música, artes plásticas, entre outras. Seu filho escolheu praticar esportes, também disponíveis no local.
O instituto segue os ensinamentos de Nise da Silveira, médica brasileira que dá nome ao lugar, investindo em diversas atividades ligadas à arte, cultura e lazer, mostrando que elas atuam como uma ferramenta poderosa de expressão dos conflitos internos vivenciados por pessoas com transtornos mentais.
A mesma mulher que antes se achava incapaz, realiza hoje inúmeras ocupações por lá. Tome um fôlego para ler todas: Elisama pinta, desenha, dança e cria esculturas em argila. Aprendeu informática com os funcionários, trabalhou como assistente na biblioteca e como designer de livros, escritos por outros pacientes do instituto. No momento, sua função é lidar com a documentação do acervo local e recebe um salário para desempenhá-la.
Ela também é uma das integrantes mais antigas do bloco Loucura Suburbana, desenvolvido dentro do instituto e que toma as ruas do bairro de Engenho de Dentro todo ano na quinta-feira de carnaval. Elisama começou lá confeccionando as próprias fantasias e as dos demais integrantes do bloco, depois passou ao posto de porta-bandeira e compositora de samba-enredo. Venceu por duas vezes com as letras que escreveu.
Se pudesse ser definida em uma palavra, seria “dinamismo”. De invisível, não tem nada, pois, a toda hora, a entrevista era interrompida para que alguém pudesse tirar uma dúvida com ela. Pedia desculpas pela demora da conversa, justificando que, se fosse contar toda sua história, “daria para escrever um livro”.
No livro da sua vida, o Nise renderia vários capítulos, de acordo com Elisama. A princípio, teve receio de chegar a um hospital psiquiátrico junto ao filho jovem, mas diz que suas vidas só mudaram para melhor depois de iniciarem seu tratamento no lugar. Guarda boas lembranças de lá, mas a maior herança do instituto, para ela, é o resgate da sua autoestima.
“Não sou mais invisível. Não tem mais isso de achar que não sou ninguém. Quando comecei a descobrir meu potencial e ter apoio de outras pessoas, tanto funcionários como outros pacientes, eu passei a me dar valor. Se todos no mundo tivessem esse mesmo suporte, não haveria mais ‘doidos’, porque a arte, a cultura, o amor, o respeito, um olhar diferente, tudo isso muda você”.
O CIEDS é responsável junto à Prefeitura do Rio pela gestão do Instituto Municipal Nise da Silveira desde 2011.