Flávio Sobreiro e Moacir Ribeiro foram os dois últimos pacientes de longa permanência internados no Hospital Psiquiátrico Nise da Silveira. Ambos agora vivem no SRT (Serviço Residencial Terapêutico) Maracanã. O marco é motivo de celebração neste dia 18 de maio, Dia Nacional da Luta Antimanicomial no Brasil, uma vez que literalmente derruba os muros que a sociedade colocou na questão do tratamento do sofrimento psíquico.
Os dois apresentavam históricos de internações psiquiátricas recorrentes e de longa data, com relatos de comportamentos agressivos, resistência para tomar banho ou medicações prescritas, entre outras questões que dificultavam a sociabilidade. A transferência deles faz parte do marco histórico de 2021, que representa o encerramento das estratégias manicomiais, com o fechamento das enfermarias de longa permanência de todo o município do Rio de Janeiro.
Agora eles moram nos SRT, um dos 93 dos quais o CIEDS faz cogestão ao lado da Prefeitura do Rio. O Serviço Residencial Terapêutico no município do Rio é o maior do Brasil, sendo uma referência no tratamento de pessoas com transtornos mentais, ao implementar uma metodologia pioneira e mais humana. Composto por casas com equipes multidisciplinares por todo o município, pessoas que estiveram por mais de dois anos em internação em instituições manicomiais passam a morar juntas em um espaço de convivência comunitária e liberdade no território.
Flávio teve sua primeira internação no Centro Psiquiátrico Pedro II, em 1997. Foi transferido para a Clínica Amendoeiras, em 2000, onde permaneceu até 2012, quando foi para o Instituto Municipal Nise da Silveira. Ao todo, foram 25 anos em internações. Ele tem um irmão, que também faz tratamento psiquiátrico, e uma irmã, que estabelece contato regular, fortalecendo o vínculo familiar, tão importante na nova forma de lidar com a questão do sofrimento psíquico.
Já Moacir tem o histórico ainda maior de internações. A primeira foi em 1982, no Instituto Doutor Francisco Spíndola. Desde então, passou por diversas instituições até chegar ao Nise da Silveira. A mãe conta que ele teve sarampo com dois anos e tétano, aos sete anos, o que o levou a uma internação em estado grave. A partir daí, teria começado a apresentar comprometimento cognitivo.
Quando Flávio e Moacir foram inseridos em um contexto mais acolhedor, começaram a apresentar melhoras em diferentes sentidos. Flávio, aos 39 anos, aumentou seu repertório de fala nos quase sete meses em que mora no SRT. Hoje, interage mais com a equipe, consegue se comunicar e inclusive nomear suas preferências. Já Moacir, de 58 anos, demonstra interesse por música e pintura, além de acompanhar futebol – seu time do coração é o Flamengo.
Reforçamos a importância de mais saúde, autonomia, resgate da identidade e cidadania. Nesta nova lógica, o serviço está conectado ao território, às famílias e aos amigos da pessoa com sofrimento psíquico. Na sociedade sem manicômios, todos são vistos e respeitados em suas individualidades.